terça-feira, 16 de outubro de 2007

"As Portas da Percepção" de Aldous Huxley


Aqui estão reunidos dois dos mais importantes textos da chamada contracultura. Aldous Huxley relata a sua percepção mística e peculiar da realidade, após a ingestão de mescalina, em 1953. Considerando a experiência como "visionária" apela a uma nova consciência, assente em misticismos e novas interpretações do mundo, bem ao estilo do universo de psicadelismo que se anunciava. Como curiosidade, recorde-se que foi num destes ensaios que James Douglas Morisson encontrou o nome para a sua mítica banda rock, The Doors.
A função do cérebro e do sistema nervoso é proteger-nos de sermos esmagados e confundidos por este amontoado de informações em grande parte inúteis e irrelevantes excluindo grande parte do que de outro modo apreenderíamos ou recordaríamos a todo o momento e deixando apenas essa selecção muito reduzida e especial do que poderá ter utilidade prática. De acordo com tal teoria cada um de nós é potencialmente detentor de uma Mente sem Limites (Mind at Large). Porém, na medida em que somos animais, o nosso objectivo é sobreviver a todo o custo. Para tornar a sobrevivência biológica possível a Mente sem Limites tem de ser obrigada a passar através da válvula redutora do cérebro e do sistema nervoso. O que sai do outro lado é uma mísera gota do tipo de consciência que nos vai ajudar a permanecer vivos à superfície deste planeta em concreto.(...)Confrontado com uma cadeira que parecia o Juízo Final - ou, para ser mais preciso, com um Juízo Final que muito tempo depois e com considerável dificuldade reconheci como uma cadeira -, de repente dei por mim à beira do pânico. Subitamente senti que isto já ia longe de mais. Longe de mais, ainda que a ida fosse no sentido de uma beleza mais intensa, de uma significação mais profunda. Analisado retrospectivamente, esse medo era o medo de ser esmagado, de me desintegrar sob o peso de uma realidade muito mais poderosa do que a que uma mente habituada a viver a maior parte do tempo no mundo confortável dos símbolos poderia suportar.(...)Por conseguinte, o cristianismo e o álcool não se misturam nem podem ser misturados. O cristianismo e a mescalina afiguram-se muito mais compatíveis, o que foi demonstrado por muitas tribos Índias do estado do Texas ao Wisconsin. Entre estas contam-se grupos afiliados à Igreja Nativa Americana, uma seita cujo rito principal consiste numa espécie de Ágape ou Festa do Amor dos cristãos primitivos em que fatias de peiote tornam o lugar do pão e vinho sacramentais. Estes ameríndios consideram o cacto como uma dádiva especial de Deus aos índios e equiparam os seus efeitos à obra do Espírito divino.(...)Nos antípodas da mente estamos mais ou menos completamente livres da linguagem, fora do sistema de pensamento conceptual.Consequentemente, a nossa percepção dos objectos visionários possui toda a frescura, toda a intensidade nua das experiências que nunca foram assimiladas a abstracções sem vida. A sua cor (esse traço distintivo da sua qualidade real) irradia um brilho que nos parece preternatural por ser de facto completamente natural - completamente natural no sentido de completamente inadulterado pela linguagem ou pelas noções científicas, filosóficas e utilitárias através das quais normalmente recriamos o mundo real à nossa própria imagem desoladoramente humana.(...)

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